A moça admirava as estrelas, sem enxergá-las direito. Na verdade não tinha foco em suas figuras régias e brilhantes. Mal notava o vai e vem das pessoas sem rosto que transitavam agitadas, loucas para chegarem as suas casas e à rotina diária sem grandes novidades de suas próprias vidas.
O que esperava conseguir ali sentada sob o manto estrelado? Nem ela sabia realmente... Mas, talvez porque, quando o vira pela primeira vez, o céu assemelhava-se muito ao dessa noite, não pôde deixar de sentir uma certa familiaridade. Era confortante estar ali e saber que não havia sonhado ou inventado aquele encontro.
Já passava da hora do jantar, quando naquela noite decidiu que não comeria nem à força o guisado preparado pela tia Muriel. Nunca apreciou as "especialidades culinárias" da velha senhora que nutria, nem tão secretos, delírios de boa cozinheira.
Pensava estar bem escondida atrás de um monte de arbustos e arvorezinhas, plantados por não-se-sabe-quem, que ficavam não muito distante do quintal de tia; quando do nada em meio às sombras, uma figura agitou-se sem fazer muito estardalhaço, em sua direção.
Sem aviso algum, a figura materializou-se ao seu lado. No início ficou tão assustada que não conseguiu se mover; gritar então... Parecia ser a última coisa a fazer. Mas com grande alívio descobriu que era apenas um menino sardento, aparentando ser no máximo uns dois anos mais velho e que assim como ela, havia decidido que aquele era um bom lugar para esconder além de menininhas sem fome, moleques arteiros.
Eles nada disseram entre si no início, apenas olhavam-se desconfiados. Mas, passado aqueles instantes silenciosos e constrangedores, aos poucos e em voz baixa fizeram contato. Timidamente disseram seus nomes e depois passaram a falar sobre coisas sem importância que naquele momento, os faziam rir sem culpas. Pareciam colegas de classe que já se conheciam há algum tempo, acostumados à presença um do outro.
A garota percebeu que os olhos de seu acompanhante de esconderijo, pareciam mais brilhantes e vívidos à medida que ele contava suas bravatas. E parecendo saber que isso a divertia, o mesmo empenhava-se com grande satisfação a tal feito. Notou também como ele tinha um pequeno sinal em sua face esquerda e que possuía pequenas covinhas que abriam-se em um encantador sorriso enquanto falava.
As horas ou minutos, naquela noite, pareceram arrastar-se caprichosamente e ela já não lembrava o porquê de estar ali. Foi então que escutaram ao longe a voz de alguém. Aos poucos, a mesma voz começou a alcançá-los e sem que se dessem conta o tempo de ambos, parecia ter acabado. Sem aviso, o menino começou a aproximar o rosto do seu e olhando intensamente para ela, depositou um rápido e suave beijo em seus lábios. Depois disso, saiu disparado pela escuridão noite adentro, deixando-a sozinha com a descoberta do primeiro amor e com o calor do primeiro beijo.
O tempo passou... As brincadeiras foram deixadas de lado. Os cabelos já não eram presos em duas tranças, agora pendiam soltos até à altura de seus ombros. Outros meninos e depois rapazes, passaram por sua vida. Mas sentada alí em frente a sua casa, tendo como testemunha aquele enorme céu estrelado, não pôde deixar de lembrar daquele que fora responsável pelo despertar daqueles lindos sentimentos.
Ela nunca mais viu o garoto, mas soube que sempre o levaria com ela e que bastaria contemplar as estrelas para tê-lo ali outra vez...
Escrito por Andressa B.
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